ELDORADO: A PÁSCOA E A LIBERDADE

Leonam Bueno Pereira[i]

     Dia 17 de abril passado comemorou-se a triste lembrança do massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará. Lá na terra distante do Sul Maravilha a exatos 15 anos, 19 trabalhadores rurais sem terra perderam a vida em um confronto com forças policiais do governo estadual. Esses trabalhadores, assim como todos os trabalhadores rurais sem terra do país, reivindicavam e reivindicam um pedaço de terra para poderem exercer o seu sonho de liberdade.

     Durante esta semana o blog “viomundo” (http://www.viomundo.com.br/) do jornalista Luiz Carlos Azenha irá publicar uma série de matérias sobre esse evento trágico. Iniciou já no dia 23 com a matéria “Eldorado dos Carajás: “A sequela física é horrível, mas a psicológica é muito maior”” em que reconstrói os eventos daquele dia, presentes e vivos na memória dos sobreviventes.

     Recentemente, dia 19 de abril, a Comissão Pastoral da Terra – CPT divulgou seu relatório “Conflitos no Campo Brasil 2010”. Em minucioso levantamento de 180 páginas, a Comissão informa para todos os brasileiros que quiserem saber: que os conflitos no campo continuam e se avolumam e clamam por soluções das autoridades. O relatório, repercutido pela coluna de Mauricio Dias na Carta Capital desta semana (nº 643), foi acompanhado por um comentário do jornalista que merece destaque: “É fácil detratar as ações do MST. Difícil é compreendê-las”.

     Não é sem razão esse comentário. O Senhor Roberto Rodrigues fez publicar na folha de São Paulo de 23 de abril, à página B8, um artigo de sua lavra intitulado: “Páscoa Vermelha”. Curiosamente e oportuno seu artigo traz as tradicionais loas à agricultura, ao agronegócio e aos agricultores. Lá pelas tantas, no finalzinho do seu artigo, o senhor Rodrigues coloca as razões do título do seu artigo: “propriedades produtivas foram invadidas, sem a menor razão de ser, um verdadeiro absurdo!”.

     Cada um entende a história da agricultura brasileira e a história do país ao seu modo. Isso está garantido constitucionalmente e reflete o processo democrático em que vivemos. A Liberdade, entre elas a de expressão, assim como a Fraternidade e a Igualdade, são direitos que todos os brasileiros, acredito, gostariam de ver realizados no país.

     No entanto, a categoria social que o autor chama de “agricultores” é claramente dividida em duas partes, de forma que, segundo o próprio Censo Agropecuário de 2006 do IBGE, são agricultores familiares, 84% dos mais de cinco milhões de agricultores do país e ocupam apenas 24% da área total destinada à agricultura, com uma área média de apenas 18,4 hectares. Enquanto a agricultura não familiar, também chamada de patronal por alguns pesquisadores, são apenas 16% dos estabelecimentos agropecuários do país e ocupam 76% da área total destinada à agropecuária, com uma área média de 309 hectares.

     Apenas por essas estatísticas básicas é suficiente para se observar que existe uma concentração de terras no país. Os agricultores familiares, os mesmos que foram massacrados em Eldorado há 15 anos, estão nessa luta por democratizar a terra no país, como escreve Maurício Dias: “A existência do MST é resultado de 500 anos da cruenta história brasileira e os números ... mostram a gravidade do problema”.

     Homogeneizar a todos pelo discurso ideológico é um dos hábitos da elite brasileira quando toca em assuntos delicados. Quando interessa propalar a ideologia do crescimento e do mercado, são todos “agricultores”. Quando vamos discutir o desenvolvimento social e econômico com distribuição de renda e igualdade de direitos...Ah! , a sociedade brasileira não está preparada, etc.


[i] Economista e Mestre em Economia Agrícola e Agrária pelo IE – UNICAMP.

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